Por Rafael Barbosa dos Santos
O que mais gosto de fazer nas horas vagas, é escrever, exercitar minha escrita e claro ir melhorando cada vez mais nesta arte.
Vou dividir com vocês, um de meus textos, fruto de um desses exercícios. Espero que gostem.
FIM E COMEÇO
TERRAÇO DE PRÉDIO – EXT/NOITE.
Augusto 40 anos,
desarrumado, á mais de 40
metros do chão, observa á imensa são Paulo coberta pela
luz do luar. Fecha os olhos, sente a briza, respira fundo, olhar melancólico. Lança
um olhar para baixo, onde carros passam em um ritmo frenético. Sente uma
ligeira vertigem, recua e se vira. Está saindo, quando nota alguém se
aproximando. Trata-se de Edilson (35) visivelmente transtornado. Ele cambaleante
caminha até a beira do terraço, olha para baixo, ameaça se jogar. Augusto
observa curioso. Os pés de Edilson já ultrapassam o chão firme.
EDÍLSON – (para si) Vamos...
Acaba logo com isso.
Augusto se aproxima
decidido.
AUGUSTO – Hei...
Edílson assustado se vira,
quase se desequilibra, encara Augusto.
AUGUSTO – Cuidado!
EDÍLSON – Quem é você?
AUGUSTO – Não importa, o que
importa é que eu estou aqui pra impedir você de fazer uma besteira.
EDÍLSON – Me impedir?...
Impossível... Eu nem te conheço!
AUGUSTO – Meu nome é
Augusto... Pode acreditar, não vale á pena fazer isso que está pensando em
fazer!
EDÍLSON – (perturbado) Você não
sabe nada, eu vou me joga sim, acabar com essa merda de vida! (mais uma vez
ameaça)
AUGUSTO – Não faça isso...
Olha, eu subi até aqui pra fazer o mesmo, eu estava disposto á me jogar, e me
espatifar lá em baixo, mas eu mudei de idéia e eu garanto que eu tinha um
motivo muito mais forte do que o seu pra isso!
EDÍLSON – Duvido... Por um
acaso você pegou sua mulher com quem ta junto á mais de dez anos, á mãe de seus
filhos, na cama com um vagabundo, se comportando feito uma vadia? (vai às lágrimas)
Aposto que não, você não sabe o peso que eu tô carregando, e não é dos chifres
não, é no coração mesmo... Eu amava aquela desgraçada, eu fiz tudo por ela,
eu... Me matava de trabalhar, pra dar o melhor pra ela... E olha só o que eu
ganhei... A minha vida acabou, já era, de que adianta essa porcaria de vida
agora? Ontem eu era um pai, chefe de família exemplar... Hoje eu sou um corno,
idiota, fracassado/
AUGUSTO – (corta) para com
isso, você acha que vale á pena se jogar, é essa sua resposta pro que fizeram
com você?
EDÍLSON – O que é que posso
fazer? Ou eu me mato, ou eu mato ela!
AUGUSTO – tem que haver
outra alternativa, se você se jogar, vai mostrar pra sua mulher que você é um
fraco. Se você se jogar, o que acha que seus filhos vão pensar? Vão crescer
achando que o pai foi um covarde, que não aguentou encarar de frente os
problemas e preferiu acabar com a própria vida! Que lição você vai deixar pra
eles, aliás, você não pensa nos seus filhos?
EDÍLSON – Eu os amo... Mais
eu sequer consigo olhar pra eles... Sinto... Vergonha.
AUGUSTO – Vergonha? Mas quem
tem que se envergonhar é a sua mulher. Para com isso cara... Se fazer de vítima,
se matar não vai adiantar nada, não vai apagar a traição que você sofreu. Você
tem dois filhos, você é jovem, deve ter seus 30 anos/
EDÍLSON – (Mais calmo) Bondade
sua... Tenho 35.
AUGUSTO – Ainda assim jovem...
É aparente saudável, tem uma vida inteira pela frente, você pode começar de
novo, do zero, pode amar alguém, mostrar pra sua mulher que quem saiu perdendo
foi ela, a melhor resposta a essa traição, é a sua felicidade, é você seguir em
frente de cabeça erguida.... (levemente emocionado) Não joga tua vida fora,
porque ela é o seu maior bem e não vale á pena desperdiçá-la por nada, a vida
ta aí, pra gente errar e acertar quantas vezes for preciso, corrigir, cair e
levantar, voltar atrás, enfim... Vem, desiste dessa loucura, me dá sua mão.
Edílson olha para o abismo
atrás dele, volta á encarar Augusto olho no olho, estende a mão, aperta á de
Augusto. Se afasta do precipício, são e salvo. Olha Augusto, agora com um olhar
esperançoso e destemido.
EDÍLSON – Você ta certo... Não
vale á pena, eu preciso continuar vivo, pelos meus moleques, e por mim também.
AUGUSTO – É isso aí, vai lá
cara, vai viver, se lambuzar com á vida, aproveita cada segundo, a vida é
preciosa.
EDÍLSON – Eu vou... E
obrigado, você me salvou.
Edílson está saindo quando
se volta para Augusto novamente, intrigado. Percebe- se Augusto com os olhos
marejados, a brisa remexe seu cabelo.
EDÍLSON – Só uma coisa, você
se esqueceu de me dizer o porquê iria se jogar, e o que o fez desistir.
SILÊNCIO.
EDÍLSON – Bem, eu soube á
uns três meses... Que... que eu tenho uma bomba relógio prestes á explodir na
minha cabeça.
EDÍLSON – (espantado) O quê?
AUGUSTO – É isso, o meu médico
disse que ela ia crescer, crescer e ia esmagando o meu cérebro até chegar um
momento em que eu não iria agüentar e... Já era... Ele tinha dito que eu tinha
pouco menos de um ano, mas hoje eu soube que o tumor cresceu muito, e então... Eu
descobri que a qualquer momento eu posso partir dessa...
Augusto vai narrando sua
história diante do olhar assombrado de Edilson.
AUGUSTO -... Espero eu pra
uma melhor (ri).
EDILSON – Nossa, eu nem sei../
AUGUSTO – Não precisa dizer
nada, o médico sugeriu que eu ficasse num hospital, mas não, seria insuportável,
não quis ligar pra ninguém, saí sem rumo, vim direto pra cá, quis acabar com
isso logo de uma vez... Mas aí, um filme se passou pela minha cabeça, eu pensei
nos meus pais, no meu irmão, na minha esposa que ta grávida, nos meus amigos,
em tudo... Pela primeira vez eu pude enxergá-los com as coisas mais importantes
dá minha vida, eu os amo muito, mas nunca pude dizer isso pra eles, porque eu
passei a vida toda trancado num escritório, controlando uma empresa, me
preocupando em ganhar muito dinheiro, e simplesmente me esqueci da dar valor ás
coisas mais importantes... Eu não acompanhei á minha mulher no primeiro pré
natal dela, porque eu tinha uma reunião importante, e ainda fui grosso quando
ela veio me cobrar, eu não tava lá quando ela ouviu pela primeira vez o coraçãozinho
do bebê, eu não fui com ela escolher as primeiras roupinhas, o berço...
Augusto desaba em lágrimas,
o outro o olha comovido. Tempo.
EDÍLSON – Sinto muito.
AUGUSTO – (secando as lágrimas
com o braço) Eu desisti de me jogar, pra poder ouvir á voz da minha mulher,
dizer que amo muito ela, e amo muito o nosso filho, pra poder ligar pros meus
pais, meu irmão, meus amigos nem que fosse pela última vez, e eu tava indo
quando você apareceu naquele estado... Por isso eu te disse pra não fazer essa
besteira, porque você ainda tem tempo de corrigir tudo, de recomeçar... E isso
eu não tenho... Queria eu poder ter uma nova chance, faria tudo diferente, iria
fazer mais pelos outros, e menos por mim.
EDÍLSON – Você fez muito por
mim hoje, salvou á minha vida... Eu nunca vou esquecer.
Augusto e o Homem ficam se
olhando por um instante. Ouve-se um toque de celular. È o de Augusto. Ele o
pega, olha o visor. Ao mesmo tempo se ouve uma sirene, distante.
EDÍLSON – Não vai atender?
Augusto o encara, olhos
vidrados, o celular se desprende de sua mão e cai no chão, continua tocando. Augusto
fecha os olhos e desmorona sobre o olhar petrificado do outro. Cai inconsciente
no chão. Edílson desaba rapidamente e tenta reanimá-lo.
EDÍLSON – Hei cara, acorda...
acorda... não faz isso...
Edílson desiste, não há mais
nada á ser feito, Augusto está morto. Ele emocionado, avista o celular que
continua tocando sem parar. Ele o pega. Titubeia mas atende.
EDÍLSON – Alô!
Do outro lado.
VOZ FEMININA (Ao tel.) – Parabéns
papai... Seu filho nasceu...
Edílson lança um olhar cheio
de ternura e compaixão para o corpo.
EDÍLSON – Meus parabéns!
Ficamos com os dois. Som da
sirene agora mais intenso. Lentamente alcançamos a lua, grande e majestosa,
iluminado o céu escuro.
FIM.